Todo mundo sabe que enviar algo para o espaço não deve ser barato, afinal não é qualquer país que, além de gastar bilhões de dólares e os anos de desenvolvimento até alcançar a tecnologia necessária, pode pagar os preços milionários dos lançamentos a cada vez que deseja enviar alguma coisa para fora do planeta. Mas você já parou para pensar em quanto custa, de fato, mandar um satélite para lá? Ou um astronauta? Ou uma refeição? 

Vamos descobrir todas essas respostas aqui nesse post, mas já adianto: Os preços são apavorantes. Se você leu esse post aqui sobre a SpaceX e como ela está barateando o custo de uma missão espacial, sabe que as coisas têm mudado e os preços estão despencando. Pois é, isso é verdade, mas não significa dizer que tá barato.

Por isso vamos ver quanto custaram diversos itens que já foram enviados para fora da estratosfera, tanto na cotação de preços da Orbital ATK (uma lançadora tradicional que encerrou operações em 2015), quanto na cotação de preços da empresa de Elon Musk

Inicialmente, um ponto importante: O preço de enviar algo para o espaço é medido em "pounds" (libra), unidade de peso do sistema imperial que equivale a pouco mais de 453 gramas do nosso sistema métrico. Assim, o preço de enviar coisas aqui nesse post seguirá o padrão das libras. 

Assim, peguemos alguns dos últimos contratos de lançamento da NASA, ambos assinados em 2014:

  • US$ 1.9 bilhão de dólares para a empresa até então chamada de Orbital Sciences [hoje chamada de Orbital ATK] para o transporte de até 20 toneladas métricas de carga, o que dá cerca de US$ 43.180 por libra enviada, ou mais de 95 dólares por grama;
  • US$ 1.6 bilhão de dólares para a SpaceX para 12 lançamentos (US$ 133 milhões por cada) de reabastecimento da Estação Espacial Internacional através da nave Dragon (com capacidade para até 5 mil libras) que dá um custo de cerca de US$ 27.000 por libra. Além disso, como a Dragon pode levar carga na ida e trazer carga na volta (já que é reutilizável) sua capacidade de transporte total sobe ao incluir a carga transportada na volta e faz o preço cair para cerca de U$S 9.100 por libra, ou pouco mais de 20 dólares por grama.

Com tudo explicadinho, vamos ver quanto custa tirar alguma coisa deste planeta tanto na cotação da SpaceX quanto da Orbital ATK.

Garrafinha de água ~520 gramas - US$ 10.445 (SpaceX) ou US$ 49.566 (Orbital ATK)

Nem na sede mais terrível do deserto do Saara uma gota de água seria tão cara como aqui. Foi por isso que a NASA teve a ideia de instalar um "reciclador" de água na EEI. Assim, toda a água consumida por lá vem diretamente dos próprios astronautas através de suor, urina e condensação. 

Pode parecer repulsivo, mas através desse truque a NASA recicla cerca de 6 mil litros de água por ano. Tendo em mente que 1 litro pesa mais ou menos 1 quilo, faça a conta de quanto é economizado com essas 6 toneladas que não precisam ser enviadas para a Estação Internacional.

Que diria que para ser um astronauta a pessoa não pode ter problemas em beber o próprio xixi?

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70 ratinhos ~1470 gramas - US$ 29.529 (SpaceX) ou US$ 140.120 (Orbital ATK)

É meio triste pensar que a melhor forma de fazer ciência, às vezes, seja enviar animais para viver condições nas quais nós, humanos, temos medo do que possa acontecer. E nenhum outro ser vivo é mais utilizado para isso do que os famosos ratinhos de laboratório. Assim, seguidamente eles se vão espaço adentro, inclusive, mais ratos já foram ao espaço do que humanos.

Quanto ao custo de envio, o bom é que os ratinhos são leves: Cerca de 21 gramas cada, sendo mais ou menos 420 dólares por animal enviado via SpaceX ou 2 mil dólares caso seja transportado via Orbital ATK.

Mas claro que você não pode mandar um único camundongo para lá, ou ele vai ficar sozinho e a coisa vai ser mais triste ainda. Foi por isso que a NASA, em 2015, enviou uma galera composta de 70 amigos que irão vivenciar e estudar os efeitos biológicos do espaço, incluindo a atrofia muscular, na pele. O que pode parecer banal tem grandes implicações importantes para a medicina aqui na Terra, inclusive aprender mais sobre doenças e envelhecimento.

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Jardim para vegetais ~7200 gramas - US$ 144.600 (SpaceX) ou US$ 686 mil (Orbital ATK)

Em 2015, os astronautas a bordo da EEI puderam provar um artigo muito especial e raro fora deste planeta: verduras de verdade, cultivadas diretamente no espaço!!

O experimento foi mais do que uma simples salada, afinal os astronautas estavam estudando os efeitos da microgravidade nas plantas. E antes que pareça bobo, pense comigo: Se vamos enviar seres humanos para Marte, entender como cultivar vegetais vai ser muito, muito importante para a viagem de cerca de 6 meses de ida (isso sem contar depois, quando firmarmos uma base no planeta e tivermos que dar jeito de produzir nossa própria comida).

Com pouco mais de 7 quilos, a estufa custou algo entre US$ 144.600 a US$ 686.300 em transporte.

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Máquina de café expresso ~2700 gramas - US$ 401 mil (SpaceX) ou US$ 1.9 millhão (Orbital ATK)

Antigamente, os astronautas eram relegados a tomar café liofilizado, aquele processo que você vê nos filmes onde os alimentos são enviados ao espaço secos e congelados, onde serão reidratados na hora do consumo. O problema era que o café era tão terrível que costumava ser uma queixa comum entre os astronautas.

Mas, não mais! Em 2015, o ISSpresso chegou a bordo da estação espacial, e o espaço nunca mais foi o mesmo. A máquina de café expresso foi criada possivelmente na colaboração mais italiana de todos os tempos: a empresa de software Argotec e a produtora de café Lavazza, ambas sediadas em Turim, e a agência espacial italiana.

A máquina, porém, é pesada: Quase 20 quilos, ou US$ 401 mil via Spacex e US $ 1.9 milhão via Orbital ATK. Possivelmente o frete mais caro de uma máquina de expresso da história.

Samantha Cristoforetti, a primeira mulher italiana em órbita, depois de preparar o primeiro expresso no espaço.
Samantha Cristoforetti, a primeira mulher italiana em órbita, depois de preparar o primeiro expresso no espaço.

 

 

Gaita de foles ~2700 gramas - US$ 54.600 (SpaceX) ou US$ 259 mil (Orbital ATK)

Muitos instrumentos já foram enviados para o espaço, incluindo gaitas, guitarras e pelo menos um saxofone, porém, nem um chama tanta atenção quanto uma gaita de foles, o tradicional instrumento escocês.

O peso de uma gaita de foles é difícil de precisar já que vai depender muito dos materiais utilizados e do design do instrumento. Ao que parece, o astronauta Kjell Lindgren, que é mostrado na foto abaixo, parece ser um flautista capaz de suportar um conjunto de gaitas de foles de tamanho normal. Porém, como sabemos, o que for possível de ser reduzido em questão de peso, será!!

Assim podemos concluir que o instrumento enviado com ele não foi o modelo "completo", mas uma versão completa, porém mais leve. Assim sendo, vamos assumir que a NASA concordou que o astronauta taiwanês tenha levado um modelo um pouco mais leve: 2.7 kg (ante os 3.6 quilos de uma gaita de foles tradicional).

Com essa configuração equivale dizer que a NASA investiu entre US$ 54.600 a US $ 259.000; um valor significante para garantir que alguém possa fazer um som lá em cima. Mas tudo bem, pois o vídeo de Lindgren tocando no espaço valeu a pena

P.S. A economia gerada por uma gaita 900 gramas mais leve foi de 22 mil a 105 mil dólares.

Até show de gaita de foles rolou por lá
Até show de gaita de foles rolou por lá. O espaço é mais animado do que você imagina

Limões ~100 gramas cada - US$ 2 mil (SpaceX) ou US$ 9.500 (Orbital ATK)

O astronauta Scott Kelly é um dos mais famosos homens no espaço desde Yuri Gagarin e a tripulação da Apollo 11. Isso porque ele passou um ano no espaço estudando os efeitos daquele ambiente em seu corpo, o que rendeu livro, documentário (e até o post aí do lado, é só clicar) e fez com que ele se tornasse uma personalidade espacial.

Embora eu discorde, a NASA deve imaginar que ficar preso no meio daquela fuselagem por todo esse tempo deve ser complicado. E se a vida te dá limões, faça uma limonada, certo? Foi esse o raciocínio para que eles enviassem um monte de limões para que Kelly pudesse fazer suco fresco a mais de 400 km de altura. (Kelly é visto fazendo malabarismo com os limões em um vídeo sobre a ciência do metabolismo no espaço).

Já que um limão médio pesa cerca de 100 gramas, cada um custou de US$ 2.000 a US$ 9.500 dólares para chegar até ele.

15 limões podem ser vistos aqui, ou seja,
15 limões podem ser vistos aqui, ou seja, de 30 mil a 142.500 dólares

Roupa de macaco ~1950 gramas - US$ 39 mil (SpaceX) ou US$ 185 mil (Orbital ATK)

Se você quiser fazer um vídeo viral diretamente do espaço, usar uma roupa de gorila pode ser uma boa ideia, conforme o astronauta Scott Kelly pôde comprovar, afinal, nada é mais legal do que um macaco perseguindo a tripulação em gravidade zero.

Como os astronautas passam meses por lá, cada um recebe presentes e lembranças de casa, parentes e amigos a cada missão de reabastecimento que chega. Foi em uma dessas que o irmão gêmeo de Scott, o também astronauta Mark Kelly, enviou-lhe o traje.

De acordo com o anúncio na Amazon desta mesma fantasia, ela pesa pouco menos de 2 quilos. Assim, fazer a brincadeira com o irmão teve um custo variável entre US$ 39.172 a US$ 185.874, bem mais legal do que as famigeradas troladas de alguns irmãos youtubers por aí.

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Bebê lula ~0,1 grama cada - US$ 2 (SpaceX) ou US$ 9 (Orbital ATK)

Não, diferentemente do que possa parecer, não se trata de um fruto do mar - embora os astronautas provavelmente apreciassem caso recebessem esse agrado a bordo de uma missão de reabastecimento - mas sim lulas reais, vivas, molhadas e enrugadas. Claro que estamos falando de outro projeto de pesquisa: os astronautas estão usando a lula para estudar a relação entre animais e bactérias benéficas em um ambiente de espaço.

Tudo advém desta espécie de lula (Lula Bobtail) ter um acordo de cooperação com uma certa bactéria. Neste caso a bactéria vive na lula, e a lula usa a bactéria para gerar luz embaixo d'água. Uma situação de ganha ganha.

As lulas bobtail são realmente muito leves, pesando de 0,005 gramas (recém-nascidas) até 2,50 gramas, quando adultas. Assim - sem contar os tubos de ensaio - cada lula custa entre US$ 2 e US$ 9 para ser levada para o espaço se adotarmos como 0,1 grama o peso médio de cada uma. Finalmente uma coisa barata de ser enviada para a Estação Espacial Internacional.

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Ser humano ~80 quilos - US$ 1.6 milhão (SpaceX) ou US$ 7.6 milhão (Orbital ATK)

Pois é, mas de nada adianta mandar um monte de coisas para lá, se não tiver as próprias pessoas na Estação Espacial para conduzir os experimentos, fazer os reparos necessários e continuar avançando. 

E não foi pouca gente não. Se contarmos desde Yuri Gagarin, o primeiro homem enviado para lá, 561 pessoas diferentes já foram ao espaço, sendo que neste exato momento (3 de setembro de 2018) 6 delas ainda se encontram por lá.

Assim, considerando que um ser humano médio pese 80 quilos, custará de 1.6 a 7.6 milhão para colocá-los em órbita, dependendo da transportadora escolhida. E se você acha que tá caro, saiba que cada voo dos ônibus espaciais (aposentados na última década) podia custar até 1.5 BILHÃO de dólares - capacidade para 7 pessoas e total de 27.5 toneladas de carga.

Quer ser astronauta? Então estude muito e faça exercícios físicos.

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As cinzas do criador de "Star Trek", Gene Roddenberry e outros geeks de peso: preço inestimável

Até aqui tudo foi pago pelo governo dos EUA, através da NASA, e dos contribuintes de lá, mas esse item aqui é diferente, já que foi enviado de forma privada. 

As cinzas de Roddenberry, sua esposa, Majel Barrett Roddenberry (também conhecida como Lwaxana Troi pelos fãs da série) e James Doohan, o Scotty original, foram para o espaço como uma carga secundária em uma missão de reabastecimento da SpaceX em 2012. (A SpaceX fez uma parceria com a empresa privada Celestis, especializada no envio de cinzas ao espaço).

Também foram incluídas as cinzas de Arthur C. Clarke, um dos escritores de ficção científica mais importantes e respeitados de todos os tempos (que escreveu a trilogia Uma Odisseia no Espaço, O Fim da Infância, entre outros).

Por ser uma carga que tinha como endereço o espaço e não a Estação Espacial, a cápsula com as cinzas foi descartada cerca de 10 minutos após entrar em órbita, onde permanece até hoje.

Se isso também soa como o funeral ideal para você, esteja preparado para desembolsar uma graninha já que colocar apenas um grama (1 terço das cinzas de uma pessoa, aproximadamente), em órbita custa US$ 2.995. Assim, se você quiser viajar postumamente para o espaço profundo, seus parentes terão que liberar US$ 12.500.

A nava Enterprise na série Star Trek
A nave Enterprise na série Star Trek

Caro? Sim, mas não dá para negar que as coisas estão melhorando para quem deseja enviar artefatos para a órbita. Voltando a SpaceX: após o sucesso do Falcon Heavy, quando este entrar em operação comercial, o preço cairá para cerca de 1.400 mil dólares por libra de peso enviado, umas 8x menos do que a SpaceX cobrou da NASA em seu último contrato.

E essa nem é a maior vantagem do Heavy: além de ser mais barato, ele tem uma carga útil muito superior e possibilita que sejam lavados objetos inteiriços muito maiores e mais pesados em uma única viagem (como satélites mais elaborados, por exemplo).

Mas o melhor de tudo vem agora: o Heavy ainda nem entrou em operação comercial e já é quase passado, pois o seu sucessor vem aí: o Big Falcon Rocket que, quando for lançado, fará o valor por libra enviada ao espaço despencar para míseros 46 dólares. Ok, ainda será bastante caro pagar quase 50 dólares para o transporte de uma garrafinha d'água, mas não se esqueça que há 10 anos atrás essa mesma garrafinha tinha um frete 200 vezes mais caro para chegar até os astronautas.