Códigos e criptografia já eram legais bem antes de Robert Langdon virar moda e o pessoal começar a achar que era o Champollion dos anos 2000. E se você pensa que ela surgiu junto com a máquina de Turing, criada na 2ª Guerra Mundial para decodificar os códigos cifrados dos alemães, spoiler: criptografia é mais antiga do que Jesus (a criptografia, porém, pode ser comprovada).

Assim, desde então diversos codificadores e decodificadores embrenham-se nos mais variados códigos e chaves, para traduzir mensagens seja na guerra ou apenas por diversão. O problema é que algumas são tão boas que nunca puderam ser traduzidas.

Confira 10 exemplos de códigos que ainda não foram solucionados e veja se você consegue quebrar algum deles.

P.S. A lista não está ordenada por dificuldade, quem é mais legal, mais antigo, etc. e sim por ordem alfabética.

Barras de ouro chinesas

Em 1933, sete barras de ouro foram emitidas em Xangai para um General chinês identificado apenas como Wang. Ao que parece as barras de ouro representam certificados de metal relacionados a um depósito bancário feito nos EUA, mas não dá para ter certeza quanto a isso apenas com os dados disponíveis.

As barras têm imagens, ideogramas de escrita chinesa, alguma forma de escrita não identificada e criptogramas em latim. A única parte resolvida de tudo isso foi a escrita chinesa que após traduzida revelou uma transação que passa dos US$ 300 milhões de dólares.

Como já era de se esperar, há uma disputa sobre a validade do depósito e quem é o real dono destes quase 2 quilos de ouro.

Os códigos que esperam por uma tradução são no seguinte formato:

JKGFIJPMCWSAEKSKCDKJCDJCYQSZKTZJPXPWIRNMQOLCSJTLGAJOKBSSBOMUPCE FEWGDRHDDEEUMFFTEEMJXZRRHZVIYQIYSXVNQXQWIOVWPJOMQOLCSJTLGAJOKB
SSBOMUPCE FEWGDRHDDEEUMFFTEEMJXZRSKCDKJCDJCYQSZKTZJPXPWIRNRHZVIYQIYSXVNQX
QWIOVWPJOMQOLCSJTLGAJOKBSSBOMUPCESKCDKJCDJCYQSZKTZJPXPWIRN

Se você quiser tentar decifrar o código, imagens de alta definição podem ser vistas aqui

Chaocifer

Sistema de cifra criado por John Byrne em 1918 no finalzinho da 1ª Guerra Mundial, quando as mensagens cifradas estavam em alta e atravessavam os campos de batalha enroladas às patinhas dos pombos. Infelizmente, para ele, o governo dos Estados Unidos não deu muita atenção à forma de criptografia desenvolvida. Mas ninguém pode dizer que Byrne não foi insistente, nem que o governo não foi firme: foram quase 40 anos de tentativas de convencê-los a comprar sua ideia (e não se esqueça do mercado aquecido por outra guerra mundial) que não deram em nada.

Ele ofereceu então uma recompensa para quem conseguisse quebrar seu código, mas até hoje ninguém reclamou o prêmio alegando o feito. O criador do código já não é mais vivo, mas seu filho atualizou e melhorou o sistema com a ajuda de 2 especialistas em criptografia nos anos 80.

EDIT: O que pai e filho não contavam era com o poder computacional que estava por vir: Aparentemente o sistema já foi quebrado com sucesso, como vê-se na imagem abaixo. Você pode, inclusive, rodar o algoritmo neste link e vê-lo criptografando e descriptografando mensagens aí no seu pc.  

Cifra de Beale

Este daqui não se sabe se é lenda ou se é real até hoje. Na verdade a criptografia é real, mas o seu resultado é a dúvida da vez (o que não impede que tenhamos uma boa história).

Tudo aconteceu em uma cidadezinha da Virginia chamada Bedford County, no século XIX. Foi lá que surgiu um panfleto, em 1885, capaz de agitar as pessoas como não se via desde a Guerra Civil, há 20 anos atrás. Ele contava a história de homem chamado Beale que havia enterrado 2 carroças cheinhas de tesouros em um lugar secreto ali por perto entre 1819 e 1821. Como se isso não fosse o suficiente para uma boa - e misteriosa - história, ele teria deixado uma caixinha fechada em posse do estalajadeiro local na mesma época em que fez os depósitos e então sumido para nunca mais ser visto.

A parte da criptografia vem agora: quando o estalajadeiro resolveu abrir a caixa décadas após o desaparecimento do seu dono encontrou nela 3 mensagens criptografadas. Incapaz de decifrar o seu conteúdo ele teria passado os códigos para um amigo pouco antes de morrer, em 1863.

Este amigo passaria os próximos 20 anos tentando quebrar a mensagem, fato que ele conseguiu parcialmente (decifrou a 2ª mensagem utilizando a declaração de independência dos EUA como chave), e daí vem o material que circulou pela região em forma de panfleto. Mesmo tendo traduzido somente 1 terço do conteúdo, isso já foi o suficiente para saber que em algum lugar da Virginia havia toneladas de ouro, prata e joias que estavam enterradas esperando por aquele que consiguisse quebrar o código.

A mensagem número 2 diz que aquelas que ainda não foram solucionadas vão dar as coordenadas exatas para o tesouro bem como o nome do homem misterioso. A parte decifrada do código diz o seguinte:

Eu enterrei no município de Bedford, acerca de quatro milhas de Buford a seis pés abaixo da superfície do solo, os seguintes artigos, pertencentes conjuntamente às partes cujos nomes são dados no número três, a seguir:

O primeiro depósito consistia em 517 quilos de ouro, e 1780 quilos de prata, depositado em novembro de 1819. O segundo foi feito em dezembro de 1821, e consistiu em 890 quilos de ouro e 590 de prata; também joias, trocadas em St. Louis para facilitar o transporte, e avaliadas em treze mil dólares (pouco menos de 230 mil dólares em valores atuais).

Estão embalados de forma segura em vasos de ferro e com capas de ferro. O cofre é maçiçamente revestido de pedra e os vasos descansam em pedra sólida cobertos com outras coisas. O papel número 1 descreve a localidade exata do cofre, de modo que não será encontrada dificuldade em encontrá-lo.

Cifra de D’agapeyeff

Sem envolver nenhuma fortuna em jogo, a cifra de D'Agapeyeff é bem menos glamourosa do que a anterior, na verdade até um pouco vergonhosa para seu autor.

Não por ela ser uma cifra incompleta que surgiu com a primeira edição de Códigos e Cifras, um livro básico sobre criptografia publicado pelo inglês-russo Alexander D'Agapeyeff em 1939, mas sim porque o autor ESQUECEU como decodificar o próprio código.

Originalmente a mensagem cifrada fora publicada como um desafio para aqueles que resolvessem estudar com o livro de D'Agapeyeff, porém, muitos entusiastas dos códigos notaram que o teste fora excluído das edições posteriores. Questionado sobre o porquê do sumiço D'Agapeyeff precisou admitir que tinha esquecido como criou o código.

Embora alguns acreditem que o código possa ser descriptografado com soluções modernas e computacionais, outros alegam que isso seja impossível, já que, provavelmente, o criador inventou algo cheio de erros e sem uma solução possível e organizada.

Cifra de Dorabella

Escrita por Edward Elgar, esta carta cifrada foi enviada para Dora Penny, sua amiga, em 14 de julho de 1897. Desde então ela permanece indecifrável, ou seja, já são mais de 120 anos de mistério.

Elgar foi um dos compositores britânicos de maior sucesso do século XIX, fato consolidado por suas dezenas de obras que entraram no repertório dos conservatórios e orquestras europeias. Mas a música não era sua única paixão: Ele também era fascinado por códigos e criptografia, misturando, algumas vezes, os dois mundos.

Um exemplo é a obra Variações Enigma, que apresenta 14 variações de uma mesma composição para piano feita por ele. Segundo o autor cada uma delas representa um enigma que remete a um traço emocional que, por sua vez, leva a um amigo seu retratado naquela composição.

Mas voltando ao código, a mensagem consiste em 87 caracteres que se estendem por 24 símbolos diferentes. Cada caractere é uma variação de 1, 2 ou 3 semicírculos que podem estar virados para até 8 direções.

Desde então algumas teorias surgiram da sua tradução como, por exemplo, que ela seria uma declaração de amor de Elgar para a sua amiga. Nenhuma das tentativas, porém, foi convincente o suficiente.

Disco de Festo

Descoberto em 1903 em uma salinha perto do depósito dos "arquivos da câmara" juntamente com o bloco Linear A (mais abaixo nessa lista) o disco de Festo é o exemplar mais importante de inscrição hieróglifa da ilha grega de Creta que se tem hoje.

Ele é mais antigo do que você imagina, datando do início do período Neopalaciano (1700-1600 AC), ápice da civilização Minoica, que morava por lá.

Feito de argila, os 2 lados estão cobertos de símbolos ainda não decifrados. Separados em grupos por linhas verticais acredita-se que cada grupo de símbolos corresponda a uma palavra, porém seu significado é um mistério. No total, 45 tipos diferentes de sinais foram identificados, dos quais poucos podem ser identificados por já terem sido usados em um período anterior, o Protopalaciano.

Como algumas sequências de hieróglifos se repetem alguns estudiosos acreditam que se trate de um hino religioso, um texto ritualístico, uma lista de soldados ou até mesmo um documento sobre a construção do Palácio de Festo (afinal não se divide a história deste povo em antes e depois de palácios à toa).

O historiador brasileiro Alberto Mendes de Oliveira afirmou nos anos 70 ter decifrado o código. Segundo ele a mensagem consistia em

Eu sou o senhor todo poderoso, supremo arquiteto universal, onisciente, onipresente e onipotente, criei os céus, a terra, o mar e tudo que neles há e conservo a verdade para sempre, para todos os povos, nações, raças e tribos dos meus domínios.

O pesquisador que acreditava que a descoberta podia leva-lo ao primeiro Nobel para o Brasil, no entanto, nunca teve o reconhecimento que almejava.

Inscrição em Shugborough

Shugborough Hall é um atual museu britânico que antes disso servira por mais de 300 anos como mansão/casa de campo para uma abastada família local. Após compararem a propriedade de religiosos eles resolveram erigir uma belíssima propriedade em estilo neoclássico e enchê-la de obras de arte, jardins, mobília, etc.

Porém, o que mais chama a atenção de visitantes e turistas não é nada disso, mas sim uma inscrição encravada em um monumento fúnebre. Baseada na pintura do francês Nicholas Poussin, a versão esculpida em Shugborough tem algumas diferenças que só fazem aumentar o mistério.

Na escultura uma mulher observa 3 pastores apontarem para um túmulo. Neste túmulo está escrito em latim Et in arcadia ego, ou, "Eu também estou em Arcadia". Um dos pastores aponta para o N em "in" e um sarcófago é exibido sobre eles (que não existe na pintura original). Por que ele aponta para a letra e o que é ou onde fica Arcadia não se sabe, mas olha que esse ainda nem é o mistério principal.

O mais complicado de desvendar vem logo abaixo: entre as letras D e M estão as iniciais O.U.O.S.V.A.V.V

O que quer dizer ninguém sabe, mas teorias não faltam. Já leu/assistiu "O Código Da Vinci" ? Lembra do Priorado de Sião e da sua missão que era guardar o segredo do Santo Graal? Pois bem, para os adeptos dessa lenda a inscrição seria uma pista para a localização do cálice que Jesus teria tomado vinho durante a última Ceia e que depois teria recolhido o seu sangue na cruz.

Segundo o livro O Santo Sangue e o Santo Graal, famoso por expor a lenda do Priorado de Sião ao mundo (e na qual Dan Brown se baseou para o seu livro) Poussin era membro do Priorado de Sião e, por isso, suas pinturas continham mensagens sobre a localização do Graal, sendo a inscrição em Shugborough mais uma parte do quebra-cabeça.

 

P.S. Arcadia é um local mítico chamado e mencionado por diversos filósofos e escritores da antiguidade, principalmente do renascimento. Segundo a lenda seria um local perfeito onde reinaria a paz e a felicidade e as pessoas vivem em harmonia com a natureza.

Kryptos

Mais um mistério em forma de escultura, porém bem mais recente que as demais dessa lista. Trata-se da obra do artista americano James Sanborn, localizada nos escritórios da Agência Central de Inteligência (CIA) na cidade de Langley, estado da Virgínia (de novo), nos Estados Unidos.

Desde a sua inauguração, em 3 de novembro de 1990, ela tem sido a diversão de funcionários da CIA e curiosos que vão até lá para ver as instalações da agência americana de inteligência. A solução nunca foi dada por seu autor (senão que graça teria?), porém, em 2006 ele deu a entender que um caractere de uma das 4 partes de Kryptos estava faltando. Assim, de 869 caracteres no total, ela passaria para 870.

Uma outra parte da escultura (são 4 no total como você verá abaixo) compreende um quadro de criptografia Vigenère, um dos métodos mais tradicionais de criptografar dados, composto por 869 caracteres (se você contar os espaços).

A primeira pessoa a anunciar publicamente a resolução das três primeiras sessões, em 1999, foi James Gillogly, um cientista da informática do sul da Califórnia que decifrou 768 dos caracteres. A parte casca-grossa que ele não conseguiu resolver, os restantes 97 ou 98 caracteres, é a mesma parte em que os próprios criptoanalistas do governo americano também ficaram presos.

Linear A

Evolução do sistema de escrita neopalaciano que vimos há pouco no Disco de Festo, Linear A tornou a linguagem mais fluida para os cretenses segundo historiadores, mas para nós ainda continua indecifrável. E se você está se perguntando o porquê de linear A, explico:  existem ainda o Linear B e C.

O Linear A está longe de ser totalmente decifrado, mas é parcialmente compreendido e pode ser lido (em partes) através dos valores do Linear B já que as 2 línguas coexistiram durante algum tempo devido a uma lenta transição entre elas. Embora as duas linguagens compartilhem muitos dos mesmos símbolos, se usarmos sílabas associadas e conhecidas do Linear B em escritas do Linear A iremos chegar a palavras que não estão relacionadas a nenhum idioma conhecido. Pois é, nem tudo é tão simples como deveria.

Esta língua foi apelidada de Minoano ou Eteocretano, e corresponde a um período na história de Creta antes de uma série de invasões de gregos micênicos em torno de 1450 AC. 

Manuscrito de Voynich

E o meu preferido ficou por último: o manuscrito de Voynich.

Os motivos são simples: um livro inteirinho (232 páginas), totalmente ilustrado, que tem, pelo menos, 600 anos de idade. Até aí tudo normal, mas o que chama a atenção vem agora: é o seu conteúdo. As ilustrações retratam plantas (nenhuma identificada até hoje), receitas de chás e remédios, diagramas astrológicos (de corpos celestes desconhecidos) e até criaturinhas humanas (mais ou menos humanas na verdade). Ahh, e claro que o idioma em que tudo está escrito é totalmente incompreensível.

A obra é diferente de tudo o que se conhece, mas foi feita com uma convicção e qualidade que, se for zoeira, terá sido a melhor zoeira de todos os tempos. Diversos criptoanalistas, entre eles verdadeiros heróis das grandes decodificações dos tempos de guerra tentaram e falharam miseravelmente em decifrar uma palavrinha sequer do manuscrito.

Logicamente que foi levantada então a hipótese de tudo ser um grande embuste. Poréééém, além do carbono ter datado o livro como tenho mais de meio século, o mais estranho é que existe um cálculo que pode ser aplicado a qualquer idioma do mundo para ver se ele é crível através das inferências de palavras, ligações, etc. Quando aplicado ao manuscrito, surpreendentemente, ele mostrou que as palavras ali contidas não são apenas riscos soltos ao léu, e sim mantém uma ordem e coerência, ou seja, o que está escrito ali tem sentido e quer dizer algo!! Se você quiser saber mais sobre essa análise linguística pesquise por Lei de Zipf

E o melhor de tudo é que se você ficou curioso para "ler" o manuscrito ele se encontra em formato digital neste link já que agora ele faz parte da biblioteca de obras raras da Universidade de Yale, que fez a gentileza de colocar um scan completinho no seu site. 

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E aí? Conhece mais algum que deveria estar na lista? Conseguiu resolver algum deles? Conte para a gente nos comentários.

Fontes: 1, 2, 3, 4, 5