Muitos pensam, na grande maioria das vezes, que quanto maior a resolução de um arquivo de música, somado a um formato lossless, maior chance terá de atingir o ideal para uma audição com a máxima qualidade. Mas não é bem assim que funciona, existem diversos fatores que influenciarão na qualidade final de uma música ao ser ouvida em um fone de ouvido.

A música pode ser influenciada pela maneira como ela é gravada, pela edição dos takes (trechos) das gravações, pela mixagem dos takes, pela masterização da mixagem e finalmente pelo formato em que é gravada a música, seja ele digital ou analógico. A partir daí, ainda surgem alguns pontos que vão diferenciar a qualidade de uma mesma música em álbuns de diferentes anos de um artista ou banda. Para começar, iremos explicar abaixo sobre o início da criação de uma música, a gravação.

Gravação

Essencialmente, a gravação será influenciada pela maneira como é feita a captação do áudio, pelos os equipamentos utilizados e o local onde foi gravado.

Abbey Road Studio - Foto por/Photo by: soundonsound
Sala "Studio One" no Abbey Road Studio - Foto por/Photo by: soundonsound

O posicionamento do microfone do ambiente poderá influenciar na captação do áudio, assim como a distância do emissor do som. Além disso, como existem diversos tipos, modelos e qualidades de microfones e cada um capta o som de uma maneira específica, eles também são fatores importantes que irão definir a qualidade final da música.

Dois microfones Neumann M49s - Foto por/Photo by: soundonsound
Dois microfones Neumann M49s - Foto por/Photo by: soundonsound

O local escolhido para a gravação terá influência na interação dos sons gerados pelos instrumentos e vozes, podendo causar diversas reverberações e alterações no timbre originalmente gerado pelo instrumento ou voz.

Sala de gravações The Gatehouse no complexo Abbey Road Studios - Foto por/Photo by: routenote
Sala de gravações "The Gatehouse" no complexo Abbey Road Studios - Foto por/Photo by: routenote

Edição de takes

Falando de maneira bem simples, o editor de áudio irá fazer a seleção dos melhores takes (trechos) das gravações feitas, realizar os ajustes que julgar necessários e finalizar transferindo produto para o responsável pela mixagem da música. O resultado da edição dos takes é chamado de stem, que nada mais é do que o termo utilizado para representar as informações de áudio digital ou analógico geradas.

Mixagem

Para que o engenheiro de mixagem possa iniciar o seu trabalho, é necessário os steams criados pelo editor de áudio.

A mixagem será a junção dos diferentes sons gravados e editados. Para que seja realizado este trabalho, é utilizado um mixer, ou chamado também de mesa de som ou console de mixagem.

Através da mesa de som, poderá ser feito ajustes de frequência, ajuste dos níveis de sinal, ajustes de dinâmica do som, posição dos instrumentos e vozes, adição de efeitos como reverberação, entre outras funções.

Mesa de mixagem EMI TG12345 na sala Studio 3 no complexo Abbey Road Studios - Foto por/Photo by: soundonsound
Mesa de mixagem EMI TG12345 na sala "Studio 3" no complexo Abbey Road Studios - Foto por/Photo by: soundonsound

Masterização

O processo de masterização é a parte onde é feita a transferência do áudio processado pelo engenheiro de mixagem para um dispositivo de armazenamento chamado master, a partir do qual serão feitas todas as cópias para diferentes tipos de mídias. A masterização tem a função de analisar o produto final gerado em diversos tipos de equipamentos como fones de ouvido e caixas de som em diversos ambientes.

O objetivo do engenheiro de masterização é conseguir chegar a uma forma de som ideal para o ouvinte, mesmo passando por diversos modelos de equipamentos reprodutores de áudio ou por compressões do arquivo de música. O desafio da masterização está em fazer a música soar bem mesmo com compressão ou distorção de áudio causada por sistemas de som de fones de ouvido ou caixas de acordo com o tipo de mídia (digital ou analógica).

Estúdio de masterização Sterling Sound - Foto por/Photo by: fmdesign
Estúdio de masterização Sterling Sound - Foto por/Photo by: fmdesign

Na tentativa de se atingir este objetivo, são feitas analises e modificações em determinadas frequências, alterando o nível de compressão do arquivo original para analisar o que é modificado: observando o posicionamento dos instrumentos em diversos tipos de equipamentos, característica do punch dos graves nos mais diferentes modelos e arquiteturas de reprodução de som, velocidade com que o som é reproduzido para ver se há uma boa coesão dos sons ao chegar no ouvido do ouvinte, a distribuição da presença dos diferentes instrumentos e vozes, a profundidade gerada pela música nas mais diferentes fontes, entre outros fatores.

Formato em que é gravada a música

Após realizado o processo de masterização, será feita a gravação do arquivo para uma mídia digital, que pode ser uma mídia digital física (CD, DVD, Blu-ray) ou arquivo digital, ou para uma mídia analógica como, por exemplo, vinil ou fita k7.

Disco de vinil
Disco de vinil

Há diferenças sonoras entre uma mídia digital e uma analógica, podendo diferir no timbre, na presença das frequências (quantidade de graves, médios e agudos), no ruído e até na extensão do som. No final, cada tipo tem seus prós e contras, mas não é o objetivo deste artigo debater a fundo sobre o assunto, podendo ficar para um próximo.

Formatos de arquivos de música

No meio digital da música, existem diversos tipos de arquivos com diferentes níveis de compressão que causa um certo nível de perda de informações. Mas será que essa perda realmente influência na qualidade final para o usuário de fones de ouvido? É o que vamos ver abaixo.

Os principais tipos de arquivos são o MP3, o AAC, o FLAC, o ALAC e por fim o WAV. Dentre eles, os que apresentam maior nível de compressão são os formatos MP3 e AAC e os que possuem menor compressão, são os formatos FLAC e ALAC. Por fim, o formato que não apresenta perdas é o WAV.

Curiosidade: Embora o formato FLAC seja comprimido em certa de 50% a 70% do tamanho original do arquivo de música, ao ser descomprimido, ele consegue reproduzir uma cópia idêntica dos dados do áudio original.

Além do formato do arquivo, temos também a taxa de amostragem (X Hz) e a profundidade de bits (X bits) que pode ser, por exemplo, de 16 bits/44kHz (qualidade de CD) ou 24 bits/192Khz. Além disso, também temos a taxa de bits por segundo (kbps) que pode variar de acordo com o nível de compressão dos arquivos.

- Taxa de amostragem (Hz): É o número de pontos de dados por segundo em um arquivo de áudio. Você precisa de duas amostras para capturar com precisão qualquer freqüência, então o áudio é amostrado em pelo menos o dobro dos limites de audição humana (aproximadamente 20 kHz). A taxa de amostragem do CD é de 44.100 Hz, isso significa que a cada segundo de som são tomadas 44.100 medidas da variação de voltagem do sinal. Dessa forma, quanto maior for a taxa de amostragem, mais precisa é a representação do sinal. Uma taxa de amostragem maior significa um tamanho de arquivo maior.

- Profundidade de bits (-bit): É o número de bits salvos para cada amostra de áudio. Uma amostra representada por apenas um bit poderia receber apenas dois valores: "0" ou "1". Já uma representação com 3 bits poderia receber 8 valores diferentes (23 = 8): 000, 001, 010, 100, 110, 101, 011, 111. Um CD tem uma resolução de 16 bits o que permite uma resolução binária com 65.534 (216) valores. Uma profundidade de bits mais alta registra um sinal com mais precisão. Uma profundidade de bits maior multiplica o tamanho do arquivo.

- Taxa de bits por segundo (kbps): geralmente medida em kbps ou mbps. Essa é a quantidade de dados de áudio transferidos por segundo.

Dynamic Range (DR)

O dynamic range (DR), ou intervalo dinâmico, é a diferença entre os maiores e menores níveis de decibel em uma música. Essa mesma distância entre níveis de decibel diz também a profundidade de bits, onde, por exemplo, 96db equivale a 16bits e 144db equivale a 24bits.

Imagem ilustrativa mostrando o que é Dynamic Range (DR) - Foto por/Photo by: urm
Imagem ilustrativa mostrando o que é Dynamic Range (DR) - Foto por/Photo by: urm

Geralmente, quanto maior o nível de DR de uma música, melhor será a sua qualidade. Quando se tem um DR baixo, quer dizer que a música é praticamente uma massa única que toca no mesmo volume sempre, podendo ocultar diversos sons no meio da gravação, ou seja, possui uma definição baixa.

Comparação da reprodução de música com DR alta (acima) e música com DR baixa (abaixo)
Comparação da reprodução de música com DR alta (acima) e música com DR baixa (abaixo)

Uma mesma música pode possuir diferentes DRs, pois dependendo da maneira como foi feita a sua mixagem e masterização no ano em que o álbum foi criado, ela pode possuir um nível de DR diferente. Para conferir este tipo de informação, você pode utilizar programas que mostram as informações sobre a música como, por exemplo, o dbpoweramp ou pode acessar o site Loudness-War.

O que dita a qualidade de som de um arquivo de música?

Depois de dizer sobre como a música é produzida, sobre os tipos de arquivos, sobre os níveis de transmissão de dados e sobre o nível de DR das músicas, você provavelmente irá começar a procurar o que leva um arquivo de música a soar melhor quando reproduzido que outro.

Este tópico será escrito com base em minha experiência própria e de vários amigos hobbystas de fones de ouvido, ou seja, será mostrado o que acontece na prática.

Ao contrário do que muitos pensam, a grande influência/diferença, utilizando fones de ouvido, não está no formato do arquivo ou seu bitrate ou sua taxa de amostragem. O que realmente influência na qualidade de som de uma música é como a mixagem e a masterização foram feitas, refletindo em um bom nível de DR (dynamic range) ou não.

Mas, quando há uma compressão em excesso, o arquivo de música pode ser afetado consideravelmente e sofrer uma queda na qualidade de som. Essa situação ocorre, por exemplo, quando o arquivo está no formato MP3 com taxa abaixo dos 192kbps. Porém, a partir de uma taxa de 250kbps, o áudio já não sofre tanta degradação e a 320kbps fica imperceptível, através de fones, a perda pela compressão do arquivo.

Para comprovar o que foi dito acima, você mesmo realizar um teste. Siga os passos:

1 - Utilize o programa dbpoweramp (exemplo) para ripar (converter) as músicas de uma mídia física que você tem em mãos (CD de música) e converta para os formatos MP3 (320kbps), FLAC e WAV.

2- Peça para outra pessoa numerar todas as faixas, anotar qual arquivo é qual e converter todos os arquivos para o formato WAV. A qualidade deles não irá melhorar, servirá somente para mascarar nível de compressão de cada arquivo.

3 - Ouça sem olhar os dados das faixas e tente classificar qual arquivo que é MP3, FLAC ou WAV.

4 - Para conferir os seus acertos e erros, pegue a sua classificação de formatos das faixas de música e compare com a anotação que a outra pessoa realizou antes da conversão dos arquivos para o formato WAV.

Conclusão

O ideal para se achar músicas de qualidade, falando de maneira concisa, é tentar analisar a mixagem, a masterização e o nível de DR dos arquivos. Não adianta você possuir um dispositivo capaz de reproduzir em 32 bits/348Khz e possuir um arquivo nesta mesma resolução, você não conseguirá distinguir de forma audível, em fones de ouvido, as diferenças.

Não estou tirando o mérito da capacidade de DACs conseguirem reproduzir diversos formatos de áudio digital e nem ter suporte para reproduzir músicas em 32 bits/349KHz e sim que isto não fará diferença na audição de seu fone de ouvido no dia a dia.

Esse artigo é feito em parceria com o Grupo Fones de Ouvido High-End: