Este artigo visa apresentar uma proposta de metodologia para a concepção e o desenvolvimento de interfaces de ambientes de ensino a distância (EaD) fundamentada nos conhecimentos de design, ergonomia de interfaces e cognitiva e usabilidade.

Esta proposta de metodologia está baseada na avaliação de uma interface de um ambiente já existente de acordo com os critérios ergonômicos de Bastien e Scapin (1993) para a verificação de pontos críticos. O resultado da avaliação ergonômica acrescido dos conhecimentos de design e usabilidade servem para implementação de novas seções do ambiente ou para o redesign do ambiente avaliado.

Interfaces de Ambientes de Ensino a Distância


Entende-se por interface de ambiente segundo Gui Bonsiepe (1997, p. 144): "...a interface permite que se revele o potencial instrumental tanto de artefatos materiais quanto de artefatos comunicativos" que também declara a importância de sua consistência para o aprendizado (p.147): "Se as possibilidades abertas pela informática serão ou não utilizadas, isso dependerá em grande parte da qualidade da interface. A interface é um meio: que pode frustar e irritar; que pode facilitar ou dificultar a aprendizagem; que pode ser divertida ou chata; que pode revelar relações entre informações ou deixá-las confusas; que pode abrir ou excluir possibilidades de ação efetiva-instrumental ou comunicativa."

Muitas das interfaces de ambientes existentes apresentam problemas na arquitetura da informação, de organização de elementos visuais, de interatividade e de funcionalidade (Nielsen, 2000).

Estes problemas nas interfaces dificultam o aprendizado dos ambientes de EaD, prejudicam a memorização, retardam o desenvolvimento de uma tarefa, causam insatisfação subjetiva e aumentam a incidência de erros por parte dos usuários.

Ambientes Epagri e REDE


A Epagri possui um ambiente na Web que oferece aos seus usuários cursos e informações sobre produtos e serviços como: agroecologia, informativo, licitações, sementes e mudas; também disponibiliza informações sobre a empresa, projetos e sobre as regionais no estado.

A interface do ambiente Epagri.

Ao ambiente Epagri será agregado o ambiente REDE que foi desenvolvido com foco principal em usuários novatos, primordialmente técnicos agrícolas das regionais da Epagri e agricultores rurais. O objetivo deste ambiente é a formação de uma rede de diagnóstico à distância das Distrofias Osteomoleculares Relacionadas ao Trabalho para a melhoria nas atividades produtivas dos trabalhadores rurais.

A interface do ambiente REDE.

A concepção e o desenvolvimento da interface do ambiente REDE foi baseado na proposta de correção dos pontos críticos encontrados no ambiente Epagri de acordo com a avaliação ergonômica segundo os critérios de Bastien e Scapin (1993) e com a aplicação dos conhecimentos integrados do design de interfaces, da ergonomia de interfaces e cognitiva e da usabilidade.

Design de Interfaces


As características de funcionalidade e os princípios do design na concepção e desenvolvimento de interfaces garantem consistência, facilidade de aprendizado e minimização na possibilidade de ocorrência de erros para os usuários de ambientes de EaD.

O designer alemão Gui Bonsiepe (1997, p. 49) fundamenta as contribuições do design na concepção de interfaces como: observar, analisar e interpretar os processos de trabalho; formular a funcionalidade de uso; inventar uma "metáfora" para interfaces; organizar os comandos; definir a seqüência de ação (roteiro); design dos componentes gráficos; estruturar o espaço de ação; design das transições entre telas; design das paletas; design dos modelos; design da documentação e design de tutoriais.

Para uma máxima funcionalidade e legibilidade, a interface do ambiente deve ser construída com unidades modulares que possibilitem a consistência de um padrão visual, ou seja, com o mesmo layout, estilo de gráficos, convenção editorial e organização hierárquica nas interfaces.

A interface do ambiente deve ter a atenção voltada para a experiência de seu usuário. Interfaces de ambientes flexíveis com estrutura não linear de design são ideais para usuários experientes, pois é muito difícil determinar exatamente os tópicos que atrairão a sua atenção e em que hierarquia (Cooper, 1995). Os usuários experientes têm como característica o alto nível de exigência e por isso, perdem facilmente o interesse e distraem-se. Para atrair-lhes a atenção é necessário estímulo freqüente através de gráficos e ilustrações interessantes.

Ergonomia de Interfaces


A Interação Homem Computador (IHC) tem definido normas e critérios ergonômicos de avaliação e validação das interfaces de ambientes, dos computadores e seus periféricos.

Em alguns laboratórios de avaliação de usabilidade, como o Laboratório de Utilizabilidade (LabUtil) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), são aplicados os critérios ergonômicos para avaliação de IHC que consiste em um dos métodos de avaliação da ergonomia de interfaces.

Em 1993, os pesquisadores Scapin e Bastien do INRIA (Institut National de Recherche en Informatique et en Automatique da França) propuseram critérios para identificar e classificar as qualidades e problemas ergonômicos de interfaces. A seguir, descreve-se os critérios e sub-critérios desenvolvidos por Scapin e Bastien:

1. Condução

  1. Presteza
  2. Feedback Imediato
  3. Legibilidade
  4. Agrupamento / Distinção de Itens
  5. Distinção de Localização
  6. Distinção por Formato

2. Carga de Trabalho

  1. Brevidade
  2. Concisão
  3. Ações Mínimas

3. Densidade Informacional

  1. Controle Explícito
  2. Ações Explícitas do Usuário
  3. Controle do Usuário

4. Adaptabilidade

  1. Flexibilidade
  2. Consideração da Experiência do Usuário

5. Gestão de Erros

  1. Proteção contra os Erros
  2. Qualidade das Mensagens de Erro
  3. Correção de Erros

6. Homogeneidade / Coerência

7. Significado dos Códigos e Denominações

8. Compatibilidade

Ergonomia Cognitiva


A ergonomia cognitiva com seus objetivos de verificação e correção atua nos processos de concepção e desenvolvimento. E, as pesquisas da psicologia cognitiva trouxeram para a ergonomia cognitiva os conhecimentos referentes aos processos e modelos mentais.

Pesquisadores da IHC representam concretamente os modelos e os mapas mentais usando uma analogia de como os usuários interagem e se movimentam em ambientes físicos. Os usuários tendem a formar modelos mentais que são mais simples que a realidade. Então, desenvolver uma interface condutiva com a metáfora do mundo real auxiliará mais o usuário na compreensão do que apresentar uma interface técnica com os elementos puros de programação.

As interfaces condutivas devem ser desenvolvidas de acordo com as características cognitivas, que são memória, percepção e representações, dos usuários. Com isto, haverá facilidade de aprendizado, de memorização, rapidez no desenvolvimento de uma tarefa, satisfação subjetiva e baixa incidência de erros.

Usabilidade


Os especialistas em usabilidade estudam como os usuários interagem com a interface, através da condução de entrevistas, trabalhos com grupos de usuários e análise de interfaces e protótipos, avaliam a qualidade da interface e então são apresentadas as recomendações que garantem a qualidade de uso.

A usabilidade se dá pela aplicação de um método que avalia e valida a interface do ambiente interativo. Esta avaliação pode ocorrer, em dois momentos distintos: na concepção da interface e depois do desenvolvimento da interface do ambiente (Winckler, 2001).

Quando a usabilidade é aplicada durante o processo de concepção da interface vários problemas podem ser detectados e possibilita correções do tipo: redução do tempo de acesso à informação, tornar informações facilmente disponíveis aos usuários e evitar a frustação do usuário (Winckler, 2001).

Projeto Prático


A interface da Epagri foi analisada através de check list de acordo com os critérios ergonômicos de Bastien e Scapin (1993) por apenas um especialista. Apesar de autores de usabilidade e IHC afirmarem a importância da avaliação de usabilidade de interfaces ser realizada por mais de um especialista, considera-se que neste caso, o resultado da avaliação do ambiente Epagri serviu como base conceitual para a concepção do ambiente REDE.

Como resultado da análise da interface do ambiente Epagri, conclui-se que ela apresenta-se pouco condutiva com problemas: de legibilidade, nos agrupamentos por localização e formato dos menus que encontram-se desorganizados e percebeu-se a falta de homogenia e coerência nos códigos, nos menus, links internos e links externos.

A análise da interface do ambiente Epagri, também, arrolou as características estruturais, gráficas e de navegabilidade deste ambiente.

Com estes dados percebeu-se que a avaliação ergonômica da interface do ambiente Epagri foi muito relevante quanto: ao levantamento de pontos críticos e para garantir homogeneidade e coerência em algumas características gráficas das interfaces que estarão agregadas. Com estas informações houve um embasamento para a concepção e o desenvolvimento da interface do ambiente REDE visando maior condutividade, facilidade de aprendizado, redução da possibilidade de ocorrência de erros e proporcionando coerência deste novo ambiente em relação ao já existente.

Na ótica da ergonomia de interfaces, o ambiente REDE foi concebido baseado na proposta da correção dos problemas percebidos na interface do ambiente Epagri, de acordo com os critérios ergonômicos para avaliação de interfaces para interação homem-computador propostos por Bastien e Scapin com o intuito de desenvolver uma interface condutiva, que guie o usuário no aprendizado sobre sua atividade produtiva e na busca da informação.

Sob a ótica do design, foi estabelecido que as características gráficas do ambiente Epagri, referente a cores e formas geométricas, seria mantido no ambiente REDE para garantir a homogeneidade e a coerência e facilitando o aprendizado da interface pelos usuários.

Em relação a usabilidade, a interface do ambiente REDE apresenta navegabilidade condutiva facilitando a busca da informação através de ações mínimas, pois os usuários tem a sua disposição na página inicial um breve enunciado sobre cada seção disponível neste ambiente. Os itens do menu que são as seções do ambiente REDE apresentam-se acessíveis aos usuários em todas as seções do ambiente.

Conclusão


Com este trabalho, verificou-se que os conhecimentos de design, ergonomia de interfaces e cognitiva e usabilidade estão intrinsecamente relacionados e apoiam-se entre si. Por exemplo, elementos como legibilidade, agrupamento de itens, feedback imediato, homogeneidade e coerência são princípios do design, são qualidades ergonômicas e também fazem parte das avaliações, através dos testes de usabilidade.

Os conhecimentos cognitivos fundamentam as recomendações do design, da usabilidade e as qualidades ergonômicas nas considerações quanto aos modelos e representações mentais para a concepção das interfaces e relativo aos processos cognitivos para a interatividade com os ambientes interativos.

Reconhece-se a relevância dos conhecimentos de cada uma das áreas: design, ergonomia de interfaces e cognitiva e usabilidade e de suas ações complementares. Com isto, considera-se de suma importância a participação de equipes multidisciplinares e interdisciplinares durante o processo de concepção, desenvolvimento e implementação para garantir a eficiência da interface de ambientes EaD.

Com foco específico nos usuários novatos o projeto prático do ambiente REDE foi desenvolvido de acordo com os conhecimentos de design, ergonomia de interfaces e cognitiva e usabilidade. Como características principais da interface do ambiente REDE: os menus foram desenvolvidos utilizando-se, principalmente, consistentes denominações. As denominações e vocabulário foi restrito ao vocabulário conhecido pelos usuários, o número de ações é bastante reduzido, para a realização de simples tarefas de escolha de uma seção com sucesso e assim reduzir ansiedade, construir confiança e ganhar positivo reforço foi disponibilizado um breve enunciado sobre cada seção na homepage.

A análise das interfaces é de grande importância, uma vez que a problemática de interfaces não condutivas, de difícil aprendizado e memorização, e com grande incidência de erros tendem a frustar e dar a sensação de incompetência, principalmente aos usuários novatos, ao interagirem com ambientes interativos.

Acredita-se ser eficiente a metodologia aplicada neste trabalho para a concepção, desenvolvimento e redesign de ambientes EaD.

Por: Lisandra Andrade
Mestre em Ergonomia pela Engenharia de Produção e Sistemas da Universidade Federal de Santa Catarina