O governo federal está preparando uma nova investida para retomar o debate sobre a regulação das plataformas digitais no Congresso Nacional nas próximas semanas. A informação foi confirmada por João Brant, Secretário de Políticas Digitais da Presidência da República, durante palestra na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Segundo Brant, a estratégia está quase pronta e se baseia em três pilares: a responsabilidade civil das plataformas, a obrigação de prevenção e precaução contra conteúdos ilegais e danosos, e a mitigação dos riscos sistêmicos causados pelas atividades dessas empresas.
"Quando falamos de regulação ambiental, por exemplo, é normal olhar para os riscos sistêmicos e criar regras para mitigá-los. No ambiente digital, ainda falta essa responsabilidade", destacou o secretário.
A principal proposta em discussão é o PL 2.630/2020, conhecido como PL das Fake News, já aprovado pelo Senado, mas parado na Câmara dos Deputados por falta de consenso. Atualmente, a atuação das plataformas é regulada principalmente pelo Marco Civil da Internet, de 2014, que só prevê responsabilização após descumprimento de ordem judicial, com algumas exceções específicas.
O tema voltou ao centro das atenções devido ao aumento de crimes cometidos nas redes sociais, especialmente contra crianças e adolescentes. A necessidade de endurecer as regras sobre as chamadas Big Techs, como Meta, X (antigo Twitter) e Google, ganha força.
Afonso Albuquerque, coordenador do Centro de Referência para o Ensino do Combate à Desinformação da Universidade Federal Fluminense (UFF), concorda que é urgente criar mecanismos de regulação. Para ele, não basta responsabilizar as plataformas; é preciso garantir transparência algorítmica e maior controle sobre o financiamento de conteúdo online.
Apesar disso, Albuquerque avalia que o ambiente político atual é complicado para a aprovação de medidas no Congresso. No entanto, fatores externos podem ajudar: o cenário de instabilidade política nos Estados Unidos, especialmente após conflitos envolvendo bilionários como Elon Musk e Donald Trump, vem incentivando outros países a reforçar sua soberania digital.
"A atuação agressiva de Elon Musk e outros aliados de Trump deixou claro o risco de ingerência das plataformas nos assuntos internos de outros países. Isso torna o debate sobre soberania ainda mais urgente", explica o professor.
Brant também acredita que episódios recentes, como os embates entre Musk e o Supremo Tribunal Federal (STF), fortaleceram a posição do Brasil:
"O Brasil suspendeu o serviço até o cumprimento das ordens judiciais, e o Musk teve que se submeter às regras. Foi um momento de virada que mostrou ao mundo que é possível impor limites."
O secretário aposta ainda que a pressão popular pode crescer a partir de temas sensíveis como a proteção de crianças e o aumento de golpes online — áreas em que, segundo ele, as plataformas ainda lucram com a disseminação de conteúdos fraudulentos.
Já Afonso Albuquerque defende que, além de legislações nacionais, o futuro precisa passar por acordos transnacionais e instituições globais capazes de fiscalizar a atuação das Big Techs em todo o mundo.